A Engenharia por trás das tecnologias vestíveis

Imagine receber uma ligação do casaco de um parente idoso que lhe informa que ele está em perigo de queda. Essa já é uma realidade na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), onde a engenheira de Produção com especialização em Engenharia Têxtil Ana Julia Dal Forno desenvolve, junto de outros profissionais e pesquisadores, uma jaqueta com sensor de quedas.

“O fio vai na trama do algodão. É um trabalho que envolve especialistas da Ciência da Computação, da Engenharia de Materiais, da Engenharia de Automação, do Design e da Moda”, conta Ana Julia, que também já desenvolveu uma jaqueta para deficientes visuais, que detecta o que tem em volta.

São as tecnologias vestíveis, que vão dos smartwatches e do microfone do Big Brother Brasil – que é um colar - à roupa dry-fit, com proteção UV e aos pioneiros aparelhos auditivos para surdez e roupas espaciais. “Mas é preciso diferenciar o que tem alguma tecnologia simplesmente empregada no tecido daqueles que chamamos de wearables, que têm comunicação com algum dispositivo externo, como os smartwatches e o casaco que faz a ligação para comunicar a queda do idoso”.

Ana Julia mencionou ainda roupas que mudam de estampa. “Ou seja, é sustentável, porque não preciso ter diversas camisetas, se com uma só podemos ter diversas estampas. Mas o descarte é uma incógnita, pois tem a parte eletrônica. Além disso, tem aquela coisa: toda inovação tem que vir para facilitar a vida das pessoas. Mas como toda a inovação, quem tem dinheiro compra, quem não tem fica sem”. Ana Julia trabalha agora em um projeto com parceria de fisioterapeutas para desenvolver vestíveis que possam melhorar a postura de costureiras.

A primeira empresa a trabalhar com nanotecnologia em tecidos no Brasil foi a Nanox, que faz impregnações de produtos antibacterianos, antimicrobianos, antivirais e absorvedores de odor em linhas de roupas. “Incorporamos esses produtos nos filamentos, no momento da fabricação da fibra, aí a durabilidade fica igual à durabilidade da fibra”, explica o CMO da empresa, o químico Daniel Minozzi.

Eles também trabalham com proteção contra raios UV em uniformes, roupas esportivas e de verão. As nanopartículas são constituídas por microesferas de vidro ocas recobertas por filmes finos nanoestruturados e transparentes de óxido de zinco, alumínio ou titânio. Esses materiais nanoestruturados funcionam como microespelhos e refletem raios infravermelho e ultravioleta que poderiam penetrar o tecido. Dessa forma, são capazes de diminuir em até 65% a transferência de calor para o tecido em um comprimento de onda de 500 a 4.000 nanômetros.

A tecnologia foi desenvolvida por meio de um projeto apoiado pelo Programa Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Pipe-Fapesp). Em testes feitos pela empresa, um tecido com as partículas incorporadas apresentou uma redução de até 6,5ºC na temperatura, em comparação com um mesmo tecido sem as partículas, ao serem expostos aos raios solares.

“Os tecidos existentes hoje para proteger contra o Sol conferem proteção só contra os raios ultravioleta. As nanopartículas que desenvolvemos são capazes de refletir também os raios infravermelhos. Dessa forma, possibilitam diminuir o calor do tecido e torná-lo mais fresco para o uso durante o dia”, disse Minozzi.

Um dos fundadores da empresa, Minozzi conta que o time hoje é composto em sua maioria por engenheiros de materiais e que é difícil fazer uma nova tecnologia rodar o ciclo do mercado. “Dry fit se popularizou porque deu tempo de a tecnologia maturar”. Em 2014, por exemplo, a agência de publicidade holandesa Gelderland Valoriseert criou uma coleção de roupas que, a partir da captação de energia solar, carregavam celulares e outros gadgets, mas a moda não pegou. “O mais difícil não é o tecnológico. É criar a relação do consumidor com o produto. Tecnologia tem. Mudando-se os padrões de consumo, mudam-se as tecnologias”, ponderou Minozzi.

A moda que pegou
Há cerca de dois anos, o cientista da computação David Acris trabalha com desenvolvimento de algoritmos de inteligência artificial para wearables para a prática de atividade física. “A partir de dados fisiológicos conseguimos usar inteligência artificial para melhorar o desempenho do usuário”. Pessoalmente, Acris, que corre semanalmente, gosta de monitorar frequência cardíaca e combinar esses dados com o GPS para montar treinos adequados, além de monitorar o sono.

Para o futuro das tecnologias vestíveis, Acris, que hoje em dia atua como engenheiro de software e pesquisador em inteligência artificial no Sidia Instituto de Ciência e Tecnologia e na Universidade Federal do Amazonas, aposta na maior precisão das informações. “Os wearables têm funções para treinos de musculação, corrida, etc. Vai ter para futebol, golfe, basebol, as pessoas vão conseguir monitorar além de informações fisiológicas, as informações sobre suas performances, com insights sobre precisão de movimentos, por exemplo”, celebra.

Outro ponto a ser comemorado é por exemplo o monitoramento de pacientes de doenças como diabetes, junto a seus médicos, que poderão receber os dados das mensurações em tempo real. Se o casaco que faz a ligação quando o idoso está caindo já é uma realidade em Santa Cantarina, imagine aonde será possível chegar!

Fonte: Confea